segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Três ilhas e uma nuvem – uma fábula analítico-comportamental.


                Gosto de provocar meus amigos analistas do comportamento escrevendo sobre uma fábula que conta a história do nascimento de três ilhas no Mar da Psicologia, divisão promovida por um terremoto que desmembrou o continente Behaviorismo: Pesquisa básica, Análise Comportamental Aplicada e Comportamento Verbal. A violência da separação inicial provocou a formação de uma nuvem de behaviorismo reduzido a pó, que continua pairando acima das três ilhas: O Behaviorismo Radical.
                Como a variabilidade é a força maior que move o mundo (no princípio era a variabilidade, depois veio a luz), ao longo de algumas gerações a língua comum do Continente Behaviorismo diferenciou-se em quatro, com dialetos próprios de cada ilha e da nuvem. Os habitantes das ilhas e os que pairam sobre a nuvem, contudo, desenvolveram características comuns: não nadam nem voam, não se comunicam nem entre si nem com outros habitantes do Mar da Psicologia.
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Agora falando sério: está na hora de começarmos a construir pontes e passarelas. Há esperança: a ABAI está preocupada com isso. Em seus discursos de posse como presidentes da associação tanto Martha Hubner em 2015 quanto Jack Marr em 2016 abordaram a questão. Publiquei um artigo em 2013 na revista Behavior and Philosophy que relata a história da separação dos diferentes grupos.




sexta-feira, 27 de outubro de 2017

Bullying – o que acontece na escola fica na escola?

Bullying – o que acontece na escola fica na escola?  Fica. Na maioria dos casos ninguém fica sabendo, só os diretamente envolvidos. Se os professores não ligam e os pais não percebem, a vítima da agressão continuada é quem vai levar os resultados vida afora. Tragédias esporádicas chamam nossa atenção para a prática, mas exatamente por (ainda) serem esporádicas no Brasil logo saem das manchetes e mesmo das pequenas notícias. Parece que nada atinge a rotina dos porões nefastos da Fortaleza da Educação, instituição milenar com estruturas e rotinas cristalizadas. Dizem que tudo que é sólido desmancha no ar, mas quem afirma isso não conhece a rotina de nossas escolas – nada é mais sólido e eterno que o ambiente de coerção.

            Em artigo de 27 de outubro deste ano Luiz Gonzaga Bertelli publicou no jornal Correio Braziliense o artigo “O desprezo pelo bullying” abordando o descaso da sociedade no que se refere ao assunto. Os números das pesquisas de IBGE e FIPE são assustadores – ocorrências de bullying estão aumentando. Ressalto do artigo o contraste de duas definições de bullying, a oficial e a mais direta. Pela oficial bullying é ato de violência física ou psicológica, intencional e repetitivo, praticado por um indivíduo ou grupo de indivíduos, executado em relação desigual de poder, causando dor e angústia, deixando sequelas na pessoa atingida. A mais direta é a tradução da definição da palavra inglesa: machucar ou ameaçar alguém mais fraco ou força-lo a fazer algo que não quer.

            O que levaria crianças a se reunirem para agredir outra criança? A pesquisa da FIPE, segundo Bertelli, aponta para posturas preconceituosas: negros (19%), pobres (18%), homossexuais (17%) mulher (11%), deficiente físico (8%), deficiente mental (8%). A vítima pode ser escolhida por outros motivos, que em geral caracterizam alguém diferente: o melhor aluno disparado, o aluno que foi elogiado pelo professor, o mais gordo ou o mais magro, etc., especialmente quando é minoria de um só.

Divertir-se com o sofrimento do mais fraco é mais antigo do que se pensa. Não é que a humanidade está piorando quanto a isso – há quinhentos anos os reis da França se reuniam com a família real em praça pública para usufruir com o povo o sofrimento de gatos queimados vivos em fogueiras (quando não havia feiticeiras para queimar). Sem dúvida temos progredido e muito no combate à coerção, na família e no trabalho, e menos na escola, mas castigos físicos já são oficialmente proibidos. Mas foram necessárias décadas de ativismo do movimento feminista para garantir que maridos violentos fossem punidos, por exemplo. Parece que há uma regra geral que reconhece o direito do mais forte abusar do mais fraco.

            Regras gerais são relações condicionais que caracterizam sociedades, grupos ou organizações e definem sua cultura. Desenvolvem-se ao longo de séculos, transmitidas e mantidas de geração em geração, e por isso são difíceis de mudar, pois são os transmissores que morrem, não as regras. Se não prejudicam a sobrevivência do grupo essas regras podem perdurar por inércia; foram úteis há milhares de anos, quando agredir os diferentes serviu para que os primeiros grupos humanos sobrevivessem em detrimento dos menos agressivos. A agressão em crianças pode ter a ver com práticas culturais de preparação de repertório, brincadeiras de faz de conta que são vistas também em filhotes de outras espécies, como os leões – as brincadeiras funcionam como preparativo para caçar em grupo quando adultos para obtenção de alimento.

Por isso mudar essas regras não é fácil, mas esse trabalho não é impossível. Sabemos muito mais sobre o comportamento humano hoje do que há cem anos. Progredimos muito no entendimento dos efeitos perniciosos da punição e de ambientes hostis – e a escola é o melhor exemplo de ambiente hostil, perde apenas para o presidio, sua instituição irmã.

            Especialmente na periferia das grandes cidades as escolas agridem já pela arquitetura, agredidas que foram pelo tempo e pelo descaso na manutenção. Alunos nascidos em famílias que seguem regras tradicionais, muito baseadas em controle punitivo (criança é a última a falar e a primeira a apanhar) chegam e são recebidas por funcionários e às vezes professores que são regidos pelas mesmas regras. O controle aversivo da escola é a continuação do ambiente de casa. É o ambiente perfeito para promover o comportamento agressivo e potencialmente delinquente que vai aparecer principalmente na adolescência – quando aparecem mais as transgressões e os suicídios.


            Não se muda uma sociedade sem primeiro mudar a educação das crianças. Tanta gente já escreveu isso que já não sei mais quem citar primeiro. Nós analistas do comportamento temos muitas sugestões baseadas em pesquisas, observações, intervenções planejadas, mas não é o caso de começar a abordá-las aqui. Basta terminar com uma afirmação: nada vai mudar enquanto a escola não for um ambiente acolhedor.


http://jctodorov.blogspot.com.br/2017/07/definicao-de-ambiente-acolhedor-partir.html




quarta-feira, 11 de outubro de 2017

Agências de controle como estruturas de poder.

  
                Em “Ciência e Comportamento Humano” Skinner definiu agências de controle como grupos dentro de um grupo maior que controlam a programação e a efetivação de consequências para certos comportamentos. Qualquer que seja o grupo, qualquer que seja seu tamanho, esse grupo exerce o controle sobre seus membros principalmente por meio de seu poder de reforçar e de punir, de acordo com regras, relações condicionais entre comportamentos e consequências, que definem o grupo.
                Dito isso, vejamos um bom exercício para os interessados em análise do comportamento.
1.       Quais as relações entre os conceitos de “agência de controle” de Skinner  e de “estruturas de poder erigidas para reprimir e domesticar” de Foucault?.

2.       Compare as frases:
 “as regras da cultura são descobertas pela observação de relações condicionais entre antecedentes, comportamento e consequências”
 e
“A ordem é ao mesmo tempo aquilo que se oferece nas coisas como sua lei interior, a rede secreta segundo a qual elas se olham de algum modo umas às outras e aquilo que só existe através do crivo de um olhar, de uma atenção, de uma linguagem; e é somente nas casas brancas desse quadriculado que ela se manifesta em profundidade como já presente, esperando em silêncio o momento de ser enunciada. ”

FOUCAULT, M., As palavras e as coisas. Trad. S. T. Muchail, São Paulo: Martins Fontes, 2002. P. XVI


“Naqueles dias, estava terminando de ler um dos amenos e sofísticos ensaios de Michel Foucault em que, com seu brilhantismo habitual, o filósofo francês afirmava que, assim como a sexualidade, a psiquiatria, a religião, a justiça e a linguagem, o ensino sempre fora, no mundo ocidental, uma das “estruturas de poder” erigidas para reprimir e domesticar o corpo social, instalando sutis mas eficazes formas de sujeição e alienação, a fim de garantir a perpetuação dos privilégios e o controle do poder dos grupos sociais dominantes.”





Skinner, o Governo e a necessidade de ciscar para dentro.


                Recentemente Diego Manzano Fernandes (Perfil no Facebook) instou analistas do comportamento a buscar relações entre avanços na Ciência Política nos últimos 100 anos e o que Skinner publicou sobre o Governo. A preocupação é pertinente. Ao especificar que o comportamento humano é função de variáveis que dependem da filogênese (espécie), ontogênese (indivíduo) e da cultura, Skinner deu muita ênfase ao desenvolvimento do comportamento de indivíduos. Contudo, em “Ciência e Comportamento Humano” boa parte do livro trata de questões que envolvem o terceiro nível de seleção, o nível cultural, mas o que seria uma psicologia social behaviorista nunca realmente se desenvolveu.

É do interesse de todos que a análise do comportamento se desenvolva em direção a todas as ciências com a quais faz fronteira, das biológicas às sociais. Mas é fundamental que esse desenvolvimento ocorra “ciscando para dentro”, com um aumento na abrangência da teoria, e não “ciscando para fora”, com áreas da análise do comportamento sendo “cooptadas” por outras linguagens teóricas.

                A cooptação tende a ocorrer sempre que há a aproximação com teorias já estabelecidas, com mais prestígio e tradição. Na interface da economia com a psicologia os estudos analítico-comportamentais sobre o comportamento do consumidor são absorvidos pelos estudos da “psicologia” do consumidor de tal forma que hoje “economia comportamental” em verdade é “economia cognitiva”, com dois Premio Nobel no bolso em menos de 20 anos.

                Na área de desenvolvimento atípico do comportamento o sucesso ao lidar com o autismo levou a um resultado semelhante. Hoje os melhores grupos da análise do comportamento adaptaram a teoria para falar de comportamento e cognição como processos diferentes, adequando-se à linguagem de outras disciplinas mais tradicionais na área.

                Para alguns autores já estamos na quarta onda das terapias comportamentais. A preocupação de Aaron J. Bronwnstein com a possibilidade de análise comportamental de relações comportamento-comportamento abriu o caminho para o desenvolvimento do contextualismo de Hayes e colaboradores, uma carta branca para o “cognitivismo-comportamental”.


                Estão esboçados acima três exemplos do que acontece com a teoria quando se cisca para fora. Se a tendência continuar veremos a análise do comportamento, que não se restringe ao que Skinner escreveu em meados do século passado (teorias são resultado de comportamentos, e como tal são suscetíveis às consequências), juntar-se a outros avanços da ciência natural sob ataque das vanguardas do atraso, os “criacionistas”. Alegar que os escritos de Skinner não podem virar doutrina não pode ser desculpa para negar na prática a visão da psicologia como ciência natural. Seriam os “cognitivo-comportamentais” os nossos criacionistas?

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Download gratuito dos volumes 1 e 2 de Trends in Behavior Analysis .

Download gratuito dos volumes 1 e 2 de Trends in Behavior Analysis .

“Brazil has the largest number of undergraduate professional courses in Psychology in the world, so far more than 220. Of those, most offer Behavior Analysis courses, some only introductory disciplines, others a full training including practical work in the field. About 30 universities offer graduate courses, both basic and applied, with 15 of them leading to the PhD. This volume of activity, production and spreading of knowledge, has been going on for 55 years, since Professor Fred S. Keller went to the University of Sao Paulo as a Fulbright Scholar in 1961. Everything considered, Brazil is second only to the United States of America in both number of researchers and of publications on Behavior Analysis.
All that notwithstanding, Brazilians are underrepresented in citations. That is understandable when we publish in Portuguese. Only people in Portugal (Europe), Angola, Mozambique, Cabo Verde (Africa), Timor East, Goa and Macau (Asia) can read what we publish in our common language (for the Asians, usually their second language). But Brazilians are also underrepresented even when publishing in English in major Behavior Analysis periodicals and books published in the US. Even Brazilian authors publishing there undercite Brazilian researchers. Citing is behavior, under the infuence of all variables that infuence choice. Having no way of directly control the environment of authors, we can at least enrich that environment. Trends in Behavior Analysis, Volume 1.01 is here offered online, for download, as an opportunity to make more of the Brazilian production available internationally.”