quinta-feira, 28 de maio de 2015

Felicidade é gostar de fazer aquilo que te pagam para fazer.


Que tal trabalhar até os 90 anos? Perguntaram a Alexander Rich por que não se aposentava, pois já tinha adquirido esse direito havia anos. A resposta surpreende os leigos, principalmente aqueles que acham que trabalho é castigo. Pois o homem que desenvolveu o método para conseguir o raio X da hélice dupla do DNA respondeu tranquilamente: e perder essa alegria (fun)?

Fred S. Keller aposentou-se na Columbia University aos 60 anos e começou outra carreira pela USP, depois UnB, Arizona State University, Georgetown University e Western Michigan University, e depois escolheu Chapel Hill, NC, para morar em um lugar menos frio, e lá trabalhou em sua biografia. Faleceu com 97 anos, impossibilitado de trabalhar por sua doença apenas nos últimos seis meses de vida. Grande brincalhão, dizia que tinha se aposentado aos 60 como cientista porque com essa idade a substância cinzenta do cérebro para de funcionar, mas a substância branca era suficiente para trabalhar com educação...

A notícia sobre Alexander Rich e a lembrança do Professor Keller me fizeram lembrar de um almoço em um sábado, em Ribeirão Preto, por volta de 1970. Silvia e eu fomos convidados por Clotilde e Sérgio Ferreira, ela uma doutora em psicologia e colega de departamento, ele um pesquisador já famoso em farmacologia e colega de pelada na areia das sextas feiras. Eu tinha acabado de receber um convite do SESI (ou SENAC, não me lembro) para fazer uma palestra sobre lazer destinada a seu público. Depois de rir com a ideia de que professor de psicologia com PhD deveria saber de tudo acabamos concluindo, depois de comparar os significados de trabalho e de lazer, que realmente não estávamos sendo pagos pela USP para trabalhar; nos pagavam para fazer aquilo que mais gostávamos de fazer: pesquisar e descobrir relações.

Que fique entre nós essa brilhante conclusão, antes que os Cid Gomes, os Requiões, os Alckimins, descubram isso e cortem nosso salário. Desconfio que o Janine já sabe, pois é do ramo, mas se esforça para que o governo não descubra...

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Generalizando a Generalização em Análise do Comportamento.



"O conceito de generalização. Avanços na Análise do Comportamento" é um novo livro a ser publicado pela Editora da Universidade de Brasília. Eis o resumo do livro apresentado pelas autoras Yvana Gadelha-Sarmet e Laércia Abreu Vasconcelos, seguido pelo prefácio que escrevi.

RESUMO
“O conceito de generalização é central na teoria da aprendizagem e tem sido amplamente utilizado tanto na pesquisa básica quanto na aplicada.  Sua importância é clara também no contexto de aplicação, entretanto, a amplitude de utilização do conceito dificulta a compreensão do fenômeno e indica a necessidade de maiores investimentos nos campos conceitual e empírico. Este livro apresenta a variação conceitual desde a década de 30, uma revisão dos procedimentos utilizados no estudo da generalização com animais e humanos e uma discussão da noção de similaridade física e funcional, parâmetros utilizados na descrição da generalização. Apresenta-se ainda uma análise de estudos sobre comportamentos sociais, uma área que se beneficia do estudo sobre a generalização”.


Prefácio

Generalizando a Generalização em Análise do Comportamento.

Cachorro mordido de cobra tem medo de linguiça. O ditado popular ilustra o uso mais tradicional do termo generalização. A picada (estímulo incondicionado) que gerou a dor e o medo (resposta incondicionada) torna a visão da cobra (estímulo condicionado) suficiente para provocar medo (resposta condicionada) e fuga. Não só o estímulo original provoca medo; qualquer coisa parecida com cobra tem o mesmo efeito para o proverbial cachorro. Generalização era um termo originalmente reservado para fenômenos nos quais um respondente era eliciado por estímulos que eram neutros antes do condicionamento. Passou a ser usado para designar o controle exercido sobre a probabilidade de emissão de um operante por estímulos semelhantes ao estímulo discriminativo. A presente revisão da literatura da Análise do Comportamento a respeito do tema mostra como generalização foi generalizada para diversas outras situações normalmente encontradas na prática profissional, especialmente na clínica, e mais especialmente no trabalho com crianças.
Em experimentos de laboratório a situação é preparada de tal forma a garantir constância no ambiente quando se manipula a apresentação de algum estímulo. Quando se acende ou apaga uma luz, por exemplo, nada mais se altera no ambiente; quando a luz acesa varia ao longo de um contínuo de intensidade ou de cor, ou de localização no ambiente, por exemplo, é possível mostrar uma gradação – quanto mais próximo ao

estímulo original, maior a probabilidade do novo estímulo ter algum controle sobre a resposta condicionada e/ou sobre o operante. Na prática profissional o ambiente nunca é tão controlado, respostas raramente são tão simples, processos se sobrepõem, mas o problema colocado para o psicólogo de qualquer orientação teórica é semelhante em uma revisão da literatura muito bem apresentada pelas autoras.

sábado, 16 de maio de 2015

Armadilhas da avaliação


            Deu no NY Times: Na pequena cidade de Menomonee Falls, Wisconsin, todas as escolas funcionam com um sistema completo de avaliação por dados concretos, observáveis, como a sujeira dos banheiros, o número de alunos punidos por infração disciplinar, e vários outros números de inúmeras outras atividades, do menu no restaurante ao número de letras que as crianças do maternal podem reconhecer.

No papel está tudo muito bem, parece um paraíso behaviorista. Cada comportamento é medido pelos seus efeitos. O diretor não precisa acompanhar pessoalmente o trabalho do faxineiro enquanto ele limpa o banheiro: o que interessa é ver se o banheiro está limpo quando o faxineiro termina seu trabalho. Quando o número de alunos punidos em uma classe aumenta, o diretor não precisa observar o trabalho do professor para saber que alguma coisa está errada. E assim por diante. O objetivo é sempre poder melhorar tudo, do desempenho dos alunos ao percurso do ônibus escolar. Você pode achar que a Análise do Comportamento finalmente chegou às escolas de Wisconsin, mas não é o caso. A inspiração veio de W. Edward Deming, engenheiro e estatístico famoso na área de Administração, que aprendeu com os japoneses a melhorar a qualidade de seus produtos usando análise estatística e feedback de trabalhadores e clientes.

           Behaviorista ou não, a abordagem usada em Menomonee Falls deu certo. Tão certo que atraiu críticas às quais os analistas do comportamento estão acostumados: o método não mostra “todo o cenário”, não leva em conta os “intangíveis”, “exacerba a cultura da avaliação”, etc. A maior crítica, entretanto, não aparece na reportagem assinada por Motoko Rich no NY Times.

Cada professor mantém um placar na sala de aula com a distribuição de frequência das notas de seus alunos, sem identificação de quem tirou qual nota.  Ao publicar a distribuição de frequência das notas o professor está reforçando o desempenho dos melhores alunos e punindo o desempenho dos mais fracos, mesmo que apenas cada aluno fique sabendo onde está no gráfico. Melhor seria um gráfico que mostrasse como cada aluno melhorou, piorou ou ficou na mesma quando são comparadas as notas com a avaliação anterior, e uma comunicação aos pais, levada pelo aluno, sobre o progresso que fez desde a avaliação anterior, independentemente de onde ele ainda está na distribuição de todas as notas naquela avaliação. 

Nada motiva mais que o sucesso, tanto mais importante quantos forem os fracassos anteriores.